18 de jul. de 2009

Humanizar

Humanizar, dizem os dicionários, é tornar humano, é inspirar humanidade, é atribuir a algo ou a alguém características humanas. Mas não quaisquer características, de preferência as boas: a compaixão, a bondade, o amor.

Na ficção, em especial no cinema, muitos são os exemplos de humanizações. No filme Náufrago, o personagem vivido por Tom Hanks, Chuck, transforma uma bola de vôlei em Wilson, um amigo com o qual troca confidências e com quem compartilha o degredo involuntário numa ilha. Parece que, sem Wilson, Chuck perderia a sanidade.

É tocante e profundamente comovente ver a dor com que Chuck percebe que Wilson desprendeu-se da jangada construída para deixar a ilha e boia no oceano sem fim, separando-se irremediavelmente de seu parceiro. Chuck chega a se jogar da embarcação e nada atrás de Wilson, apenas desistindo ao perceber que, se persistisse na busca, não conseguiria voltar para a jangada.

No filme Wall-E, vemos uma série de robôs com adoráveis características dos homens, mas apenas um com uma marcante postura humana e humanizante: o tímido e apaixonado protagonista. Falei um pouco sobre esse filme aqui.

E não apenas objetos sem vida biológica tornam-se humanos nas telas do cinema. É infindável a quantidade de filmes em que animais apresentam caracteres mais humanos que homens e mulheres. Como exemplo máximo para mim, está King Kong, com seu olhar de ternura e tristeza, cativando a bela Ann Darrow.

Sim, somos capazes de enxergar humanidade onde ela não existe, somos capazes de emprestar aquilo que temos de melhor para que nossa vida seja mais bela, mais justa, mais civilizada. Mas nem sempre conseguimos humanizar a vida, até mesmo onde ela já é humana.

Falo isso porque nossa sociedade está prestes a aceitar o aborto de fetos anencéfalos. O Supremo Tribunal Federal irá julgar a ADPF 54, e a tendência é que inclua essa possibilidade de abortamento às permissões já existentes: no caso de estupro e de risco de vida à mãe.

Será que o anencéfalo, uma criança com má formação do encéfalo, não é humano? Será que não reúne todas as potencialidades de um ser humano, apenas tolhidas por uma deficiência? Será que devemos ter a mesma postura (abortar, eliminar) com os seres humanos adultos que, por alguma circunstância (acidentes, doença), ficaram na condição de deficientes?

Por que nos emocionamos com o olhar apaixonado do gorila gigantesco, mas somos indiferentes à sorte desses bebês? Por que rimos das brincadeiras ingênuas do robô Wall-E mas elegemos uma razão fria e insensível para decidir o futuro de quem não pode se defender? Por que essa contradição, em espalhar humanidade na criação humana mas negá-la onde ela já se encontra?

Nenhum comentário: