4 de abr. de 2010

Nova Geração

Virou parte do senso comum a afirmação de que "as crianças de hoje são mais avançadas do que nós".

Para justificar essa afirmação, costuma-se lembrar da facilidade com que as crianças dos nossos dias lidam com a tecnologia, os computadores, videogames e outros aparelhos eletrônicos.

Fala-se ainda que as crianças são mais inteligentes, aprendem as coisas com mais facilidade e rapidamente deixam seus pais, tios e avós obsoletos, quadrados, conservadores e ultrapassados. São, em resumo, a "nova geração", que está deixando a outra para trás.

Concordo parcialmente com essas ideias. Aliás, teria até motivos para aderir, com entusiasmo integral, aos que pensam daquela forma. O pequeno Pedro, no intervalo de uma semana, enviou dois torpedos via celular, incluindo uma foto em um deles. Ele tem um ano e um mês de idade.

De fato acredito que as crianças são mais avançadas do que nós. Partindo da realidade de que o progresso está sempre ocorrendo, é sensato e racional admitir que, da mesma forma como estamos vivendo em uma era mais avançada que nossos pais, o mundo em que nossos filhos viverão será mais moderno que o nosso.

Mas acho que há muito exagero na afirmação das qualidades da nova geração. As crianças são maquininhas de aprender: observam tudo com muita atenção e repetem, a seu modo, o que registraram.

O fato é que hoje, desde cedo, as crianças estão expostas à tecnologia e a uma infinidade de aparelhos e bugigangas eletrônicas. Conte a teu redor tudo o que tem pilhas e baterias e você se surpreenderá.

É normal, portanto, a criança estar inserida num ambiente "tecnológico", por assim dizer, muitíssimo diferente daquele no qual fomos criados e, mais ainda, daquele frequentado por nossos pais e avós.

Tínhamos, em casa, uma velha televisão em preto e branco, cujos parcos canais eram trocados no seletor de botão. Nosso telefone era cinza, pesadão, com o tradicional disco. Havia um toca-discos Philips, cuja maior inovação eram três faixas de sintonia; você podia sintonizar cada uma delas em uma estação diferente, e podia mudar quando quisesse apertando fortemente um botão. Era uma memória rudimentar, mas muito prática, pois evitava que você girasse o dial em busca de outra rádio preferida.

Nosso único brinquedo que usava pilhas era o Ferrorama. Quando as pilhas fraquejavam, eram colocadas no congelador, onde, acreditava-se, elas se recarregariam. Acho que não funcionava.
Quando nossa mãe comprou, após inúmeras prestações do Consórcio Nacional Sharp, um video-cassete, lembro que eu e meus irmão lidávamos sem dificuldade com o aparelho. Gravação, reprodução, dominávamos os comandos daquele controle remoto todo em inglês e com vários botões.
Já para minha mãe a tarefa era impossível. Ela simplesmente não conseguia manusear aquela nova geringonça, e tínhamos de interpretar e fazer as ações por ela.

Tudo por que éramos crianças, tínhamos por natureza uma pré-disposição para aprender, uma curiosidade própria do mundo infantil para descobrir como as coisas funcionam. Para minha mãe, um mistério insolúvel; para nós, um caminho a ser desvendado.

E hoje isso continua a acontecer. A diferença é que nossas crianças são expostas a um mundo mais rico de descobertas, e nós, como adultos, já começamos a nos acomodar em nossas preferências, evitando mudanças bruscas e riscos desnecessários. Tudo dentro da ordem natural das coisas.

Fomos a nova geração para nossos pais, nossos filhos serão a nossa, nossos netos a deles. A natureza não dá saltos. As crianças sempre aprenderão tudo, por nos observarem sempre, e atentamente.

Apenas para esclarecer: Pedro enviou os torpedos simplesmente por pegar o telefone celular e apertar continuamente as teclas, numa ordem aleatória que acabou por gerar as mensagens. Tudo isso porque nos observou, antes, fazendo a mesma coisa: teclando e teclando naquele aparelhinho que brilha e toca música.

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